As viagens à Disney e a construção do querer

Sempre sou atacado por dizer que a Disney – como destino turístico para adultos – é uma idiotice. Muitos me taxam de tirano e dogmático, afirmando que sou contra um princípio simples da liberdade: um indivíduo deve fazer aquilo que gosta.

Muito bem, notem a fragilidade dessa linha de raciocínio. Que tal um pedófilo que é feliz ao estuprar garotos de cinco anos? Impediremos esse homem de ser feliz? É claro que é um exemplo extremo, mas serve para ilustrar que a coisa não é tão simples como sugerem os filósofos dos comentários. Não se trata só de fazer o que gosta e pronto. O buraco é mais embaixo.

Começa pela própria construção do querer. Percebam que nossos gostos pessoais são o resultado de um processo bastante complexo e muitas vezes à parte de nós mesmos. Um exemplo básico seria a escolha da religião. Tendo nascido no Brasil em uma família católica, uma pessoa teria mais chances de ser cristã ou muçulmana? Se trocarmos o local de nascimento para o Afeganistão, não trocamos também a direção desse gosto pessoal?

Não há problemas em ser católico porque seus pais são católicos. Só há problema quando não há reflexão sobre isso. Tendo percebido que suas escolhas religiosas foram influenciadas pelo seu ambiente cultural, há dois caminhos. Ou o camarada analisa várias religiões e opta por uma que mais lhe apetece de acordo com sua personalidade ou simplesmente segue o comportamento do bando. Naturalmente esses dois caminhos estão presentes em cada preferência da vida, com influências diversas. E naturalmente o comportamento em bando impera, uma vez que é o mais simplório.

Vejamos o caso da música. Existem milhares de estilos musicais no mundo, mas mesmo diante de tanta abundância, são raros os indivíduos que conseguem enumerar mais de vinte tipos diferentes. Dentro dessa lista de estilos conhecidos, a pessoa provavelmente gostará de um ou dois tipos. É uma limitação extrema se considerarmos um cenário tão abrangente. Por que isso ocorre? Bando. A televisão mostra isso, na escola todo mundo gosta de tal coisa, e isso vai sendo seguido sem qualquer reflexão até tornar-se gosto pessoal.

O danado é que o comportamento de bando também age nos objetivos de vida, nos aspectos profundos da existência. Ter uma casa, um carro, passar no concurso público, todo mundo realmente quer isso? Se alguém opta por viver vendendo picolé na praia estará fora da norma. Dirão que isso não é sonho de verdade, sonho de verdade são esses que todo mundo é levado a crer.

A mesma coisa ocorre com destinos turísticos. As viagens são sempre para a Europa e Estados Unidos, a ideia sempre é compras, fotos no Facebook e vivências rasas. A Disney está no conjunto, um sonho de infância incutido, sem reflexão, vendido como a melhor coisa do mundo, reforçado pelas horas de desenhos animados e filmes. Será mesmo que você gosta da Disney? Isso está associado à sua personalidade ou é algo construído, implantado? Acredito que na grande maioria dos casos é apenas um sonho forjado.

Por isso creio que a Disney – como destino turístico para adultos – é uma idiotice.

Um grande abraço

Pedro Schmaus