Você viaja para onde eles querem

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A imagem acima é da Igreja de Cristo em Windhoek, capital da Namíbia, um lugar que raramente aparece em alguma revista brasileira de viagens. E quando eu digo raramente é só para não usar as palavras nunca e jamais. O caso é que Windhoek não está sozinha na estatística do desaparecimento de destinos.

Entre janeiro de 2010 e abril de 2013, a revista de turismo mais lida do Brasil publicou 40 edições. Em todo esse período a imagem principal das capas abordou cenas de somente 11 países dos quase 200 existentes, todos localizados em apenas dois continentes (América e Europa). Não há sequer uma capa sobre locais na Ásia, Oceania ou África.

Evidências como essa mostram que as escolhas no campo do turismo são tarefas ilusórias. Achamos que tomamos decisões com base em nossos gostos pessoais, mas na verdade nosso imaginário foi construído de maneira limitada, quase em uma proporção de 11 para 200. É o resultado de ter como base esses guias de viagem e revistas especializadas, logo essas publicações que são feitas para vender pacotes.

É uma realidade de mercado: o destino com mais grana para investir será sempre o mais indicado nos textos, afinal as publicações impressas não vivem de brisa. Já os destinos sem verba – mesmo aqueles muito bons – simplesmente não recebem destaque em revistas e saem das listas dos viajantes brasileiros. A capital da Namíbia é um bom exemplo.

Resta então o trabalho do viajante comum, aquele indivíduo que gasta sua própria grana para conhecer o mundo e compartilhar suas experiências em um blog perdido em meio à imensidão da internet. No entanto, mesmo os textos escritos por esses bem-intencionados indivíduos podem ser enganosos.

Não que falte sinceridade, a maioria dos blogueiros escreve o que realmente sentiu durante uma incursão. Em geral não estão mascarando coisas motivados por patrocínios. Porém, o julgamento da qualidade do destino é algo muito subjetivo e transitório. Subjetivo porque se molda aos gostos pessoais. Se uma estilista e um surfista viajam juntos para Milão, quem provavelmente achará mais divertido? E se o casal decidir dar uma passada em Bali, como vai ser? Nesse prisma um hotel ou uma atração podem ser tanto ótimos como horríveis, depende do filtro do viajante.

A avaliação também é transitória porque os contextos mudam. Dois casais em dias diferentes visitam Puerto Varas, no Chile. Para uma dupla fez sol, para a outra só choveu. Porém, o casal do dia ensolarado brigou e nenhuma paisagem natural foi capaz de compensar a chateação de uma DR durante a viagem. Já o casal dos dias chuvosos aproveitou para ficar no hotel e colocar em dia as posições do Kama Sutra. Tudo isso influenciará a percepção de como eles viram Puerto Varas e de como será escrito o relato.

Outro fator é a limitação da narrativa em si. Viagens são como filmes e relatos de viagens são como os trailers. Quem nunca se enganou com um trailer, positiva ou negativamente? O fato é que – assim como o trailer não define o filme – nenhuma foto, descrição, vídeo ou recomendação preparará alguém para visitar um lugar. O indivíduo só saberá se um destino é bom para ele quando visitá-lo pessoalmente. A vantagem do relato do viajante comum é que ele não estará infectado pelo fator financeiro ou por imagens super produzidas. Se há algum teor de parcialidade isso vem de sua personalidade ou dos acontecimentos durante a viagem em si, algo muito mais autêntico e que pode ser corrigido pelo autor mais atento.

É inegável que precisamos de informações para compor nosso imaginário e organizar nossas incursões, mesmo diante das possíveis falhas das fontes. Uma pesquisa diversificada pode ajudar muito a saber se aquele lugar tem a ver ou não com o que você espera. Fuja dos clichês e das revistas. Leia tudo que puder e se concentre nos relatos de viajantes comuns, desses que podem ser encontrados em blogs pessoais ou sites de mochileiros. Essa etapa – se feita com calma e dedicação – pode levar o viajante a ir visitar lugares que ele realmente desejava conhecer, sem falsas expectativas.

Abraço!

Pedro Schmaus

Mais sobre a coluna Viagens do S&H

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