Crítica Jogos Vorazes: A Esperança – O Final ≈ Cine Verité por Rafaela Gomes

Emergido como um produto cultural com um público bem demarcado e supostamente recebido como uma série que viria para substituir o vazio deixado por “Crepúsculo”, “Jogos Vorazes” interrompeu um quase hiato que surgia no cinema hollywoodiano, no gênero de produções sequenciais voltadas para crianças e adolescentes. Enquanto a trama juvenil adolescente vampiresca se despedia no cinema, no mesmo ano a pós-apocalíptica chegava às salas, se consagrando como um fenômeno cultural e, por que não, social.

O fascínio por “Jogos Vorazes” foi natural pela brutalidade nas cenas de ação, pelo debate pertinente e por não se firmar apenas no gênero Young-adults, que possui tramas sérias com toques de leveza e dramas atraentes aos mais jovens. Ainda sendo para esse nicho, a adaptação da trilogia de Suzanne Collins trouxe para os corredores da antessala dos cinemas uma discussão que antes só era comum nos corredores das universidades: a manipulação midiática e a arte como instrumento de guerra.

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Em “Jogos Vorazes: A Esperança – O Final” vemos a conclusão de uma história iniciada lá em 2012. A série, que transformou Jennifer Lawrence na nova queridinha da América, não apenas reafirmou carreiras de velhos conhecidos para o cenário de blockbusters, como Woody Harrelson, Donald Sutherland e Stanley Tucci, como também apresentou Liam Hemsworth e Josh Hutcherson, que encabeçam o protagonismo com segurança e firmeza ao lado de Jennifer.

A saga, que se estendeu por dividir o último livro em duas partes, trouxe adolescentes para uma discussão que talvez nem eles mesmos percebam, tamanha sua dimensão. E devido a essa mesma vertente madura, liderada por personagens novos, as salas foram repletas de adultos que foram capazes de ir além do tal “drama adolescente” e o “todos viveram felizes para sempre” que permearam vez outra os quatro filmes.

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Ignorando alguns clichês apresentados nos minutos finais do último capítulo da saga, “Jogos Vorazes” traz em toda sua essência, temáticas que vão desde a manipulação de um povo através da mídia e da ausência de conhecimento à utilização do próprio cinema como instrumento para fomentar guerras, plantar ideias e criar ideais. Em uma época onde não há limites tecnológicos e a concentração do poder está exclusivamente nas mãos de um governo ditatorial que atua através do medo, a trama facilmente envolve os apaixonados por história, à medida que nos entrelaça em um enredo onde o sangue é o grande trunfo e o troféu de um embate justo, mas dilacerado.

Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence), mais do que nunca, é apresentada no último capítulo como um peão de uma luta que ela nunca quis travar. Uma líder nata que pouco compreende sua influência diante de uma nação inteira, ela tenta se esquivar a todo tempo de confrontos, mas é inevitável ser levada para o centro de tudo. Vista como um símbolo e sustentada como tal pelos Rebeldes, Katniss assume o rosto da revolução, lidera combatentes no fronte de batalha, enquanto – ironicamente – é posicionada atrás do exército, a fim de que sua vida seja poupada para manter a chama da esperança acesa.

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Com sua imagem trabalhada frequentemente diante das câmeras, ela é envolvida pelo outro lado da guerra, se tornando também o rosto da manipulação midiática, ainda que fuja dos roteiros enlatados preparados. À medida que seu papel é construído pela líder revolucionária Alma Coin (Julianne Moore) e pelo sub-líder Plutarch Heavensbee (Philip Seymour Hoffman –papel que possui razões mais honestas), ela também se desconstrói nos inúmeros projetores espalhados pela Capitol, através da voz do presidente Snow (Donald Sutherland). Como alguém que possui motivações genuínas e uma impulsividade incontrolável, Katniss surge em “A Esperança – O Final” como uma Joana d’Arc futurista, uma militar que encabeça a libertação da Capitol (ou seria tomada?) à sua maneira, sem perceber a profundidade da guerra na qual foi posicionada.

O ideal de convencimento da guerra é frequentemente bombardeado entre os militantes de ambos os lados e em “A Esperança – O Final” vemos que a retidão pode ser dúbia, dependendo do lado em que você joga. A perspectiva brutal dos entraves, das mortes não justificadas, mas aceitáveis e o desejo pela vitória (com propósitos já não tão claros) é trazida em cenas bem dirigidas, aceleradas e repletas de ação, em meio a rápidos momentos de calmaria, que logo são rompidos por estrondos, tiros e bombas. Os efeitos especiais novamente surpreendem, sendo bem executados com naturalidade, em uma produção que não apenas usa o artifício como também precisa dele para a construção do seu universo pós-apocalíptico.

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O encantamento e envolvimento com Jogos Vorazes por parte do público mais adulto pode ser justificado justamente por trazer a batida temática pós-apocalíptica de forma mais madura e com argumentos novos, embasados em precedentes históricos. O assunto, que teve seu auge nos anos 2000 com filmes como “Equilibrium” (2002) e “A Ilha” (2005), volta a tomar espaço por meio da literatura, como vemos com “Maze Runner”, “Divergente” e “O Doador de Memórias”. Mas fugindo do enfoque mais juvenil que essas três séries trazem, “Jogos Vorazes” nos remete um pouco à mesma ‘logística’ de guerra vista na Segunda Guerra Mundial, mais precisamente com o Nazismo.

Talvez a memória de muitos falhe nessa questão, mas o cinema foi uma das principais armas de difusão da ideologia nazista. A propaganda política foi tão bem feita através da arte que possibilitou que a ideia – ainda que corrompida, mas mascarada para a população – fosse comprada facilmente. A premissa da defensiva através do ataque, salientando a proteção e possível extinção da raça ariana, se não houvesse intervenção bélica, motivou o pavor e consequentemente a defesa do nazismo. Hittler fez da guerra por puro ódio sua luta pelo “bem comunitário”. E nós bem sabemos que, o povo alemão em sua maioridade só descobriu os horrores do Nazismo após a intervenção territorial dos exércitos russos e americanos, que os forçou a enterrar os milhares de corpos estirados em campos de concentração até então desconhecidos pela população.

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Essa mesma tática é repetida na saga, mais precisamente neste último filme. Ambos os lados não se esquivam do poder do entretenimento como disseminação de uma ideia e a estratégia se torna eficaz nas duas direções. Em “Jogos Vorazes”, a construção desta trama também divide espaço com o triângulo amoroso composto por Katniss, Peeta (Hutcherson) e Gale (Hemsworth), que ainda que possua seus vestígios juvenis – naturalmente – é apresentado como o único respiro de normalidade no contexto em que todos se encontram.

A saga se encerra com ares genuínos de despedida, prolongando seu fim um pouco demais com um belo e suave adeus. Com encerramento um tanto previsível, “Jogos Vorazes: A Esperança – O Final” agora gera um novo hiato para o público mais novo, espaço este que a série “Divergente” parece ser incapaz de preencher. Independente disso, bem ou mal, a jornada de Katniss Everdeen chega ao final. Se ela se perpetuará com um debate permanentemente atual? Só o tempo vai nos responder.

Sacerdote da Santa Igreja do Culto ao Nintendinho, Ryu se declara um rapaz casto e introvertido, no fundo desculpas para seus constantes fracassos com as mulheres. Adora surfar, mas não sabe nadar e sonha em conhecer uma praia. Ex-modelo, ex-feirante, ex-atriz, ex-torcedor do Mixto, Evel na verdade é um extraordinário colecionador da série telecurso 2º grau, sabe de cor e salteado todas as lições de química e marcenaria contemporânea. Amante da boa cozinha, não dispensa um churrasco de gato no boteco da Zuleide. Adora aventura e sempre que pode arrisca-se no truco indoor, desde que o ambiente seja refrigerado. "Onde há flor não há envido!"